A Conversa Com ... Monday
A Catarina é uma pessoa que tive o prazer de conhecer
através da faculdade. Além de extremamente interessante, é um doce. Mas isso
podem vocês ler por vocês próprios.
A Catarina tem um
projeto musical – Monday – sobre o qual eu quis saber mais e que agora é uma pequenina parte da minha vida e dos meus excertos. O seu novo EP sairá em
2020, mas até lá podemos contar com “Little Fish”, o primeiro single deste EP
que é para ouvir e viciar, sem dúvida! (sim, eu já ouvi eheh).
É alguém que vale a pena conhecer.
(foto da artista cedida pela mesma) |
O teu nome artístico é Monday.
Porquê?
Eu tive uma fase que durou cerca
de 7 meses em que estive à procura de um nome e pensei em usar o meu nome:
Catarina Falcão ou Cat Falcão. Só que parece que é “Két” e não Cat, que era o
que eu preferia. Isto porque testei uma vez, toquei uma vez ao vivo e na altura
era Cat Falcão. E disseram-no de uma forma tão errada para mim que foi tipo:
“Nop! Não vai dar, estamos em Portugal ninguém vai saber dizer o meu nome como
eu o quero, portanto não vale a pena”. E Monday surgiu depois de várias
tentativas. Eu não estava cem por cento convencida, mas na altura estava a
trabalhar com a Manuela Peixoto que é designer gráfica, que foi quem tratou do artwork
todo do meu disco anterior; e eu mandei-lhe a sugestão e ela disse-me: “Adoro,
é um nome muito feminino, apesar de não ser imediato.” No fundo, achei alguma
piada ao nome Monday também pela simbologia que tem. É o início da semana, o início
de um novo ciclo e faz sempre aquele go back; recomeça tudo sempre outra
vez. Hoje em dia, já não sou tão fã do nome…
Porque também não és fã de
segundas feiras?
Por acaso continuo a gostar, mais
do que terças por exemplo. Terças toda a gente odeia (risos). Mas porque é um
nome super difícil de se encontrar na net e em termos estratégicos não
foi a melhor aposta que eu fiz. Mas tudo bem.
Achas que é tarde para mudar?
Acho que é, sim. Se eu alguma vez
me fartar deste projeto em específico tenho sempre aquela liberdade de fazer
alguma coisa com outro nome e que não é o meu nome. Portanto há essa vantagem em
não ir para o meu nome. Além disso, acho que não funciona e que não é um nome
artístico muito engraçado. E tenho sempre essa vantagem de me poder renovar,
salvo seja, se for preciso, dando um nome diferente – arranjando outro
pseudónimo para aquilo que eu estou a fazer.
Porque tentas que o teu nome
artístico esteja de algum modo ligado ao estilo de música que fazes?
Estilo de música é uma componente
do que eu estou a fazer, sim. Mas mais àquilo que eu estou a sentir na altura.
Se calhar quando pensei em Monday estava um bocadinho nessa de “eu preciso de
recomeçar, eu preciso de voltar a sentir alguma coisa do início”. E foi, foi a
primeira vez que me aventurei a solo. Porque eu tive uma banda com a minha irmã
Margarida, Golden Slumbers e nós já tocávamos há muito tempo e foi sempre uma
coisa de grupo. Estava muito habituada e muito dependente de outra pessoa. E
Monday foi aquela primeira vez que pensei “I have the balls to this”.
Portanto, é o meu início de semana.
Qual a mensagem que tentas
transmitir na tua música?
Depende, depende. Isso depende
muito de música para música. E de fase para fase. Vou falar daquilo que já
tenho lançado – o meu disco anterior. Hoje em dia, já não relaciono muito com
esse disco. Acho que nessa altura eu estava um bocado zangada com tudo e com
todos. E, no fundo, aquilo também é bastante autobiográfico. Na altura, era
muito sobre histórias das minhas relações com pessoas: com a minha mãe; com o
meu pai; com um rapaz, uma relação que eu tinha com um rapaz. Portanto aí, se
calhar, aquilo que eu queria dizer até era algo mais egoísta, eu precisava de
desabafar. Eu não sou uma pessoa que tenha muito jeito para palavras no
dia-a-dia. E arranjei ali uma forma de canalizar isso. Mais ou menos poética,
mas é a minha forma de dizer “ok, eu sinto isto, toma lá” e é bastante
terapêutico nesse aspeto. Fica na canção e muitas vezes até me resolvo dessa
maneira.
E voltas a ouvir a canção? Ou
não queres mais?
Isto vem por processos. Eu
escrevo-as em casa. Gravo-a em casa versão demo. E ouço-as mil vezes. Porque
quando tu escreves alguma coisa que gostas, ou quando tu fazes alguma coisa que
gostas, tu ficas ali meio obcecada e entras numa espiral de “isto é a melhor
coisa do mundo”. Então, quando acabo de escrever e de compor as músicas,
ouço-as imensas vezes e fico mesmo orgulhosa. Depois entre tu escreveres a música
e lançares a música demora tanto tempo, que perde um bocadinho essa magia
inicial. Mas ganha outra. Porque de repente ganha formas diferentes, porque
tens outras pessoas envolvidas, a tocarem outros instrumentos, a tocarem e a
produzir. Até no próprio som, nas misturas, etc. E isso cria um produto
diferente daquilo que tinhas inicialmente. Vem com algo que era teu e que já
estava feito e que se eleva. E perdi-me (risos) qual era a pergunta?
Se guardavas as músicas só
numa caixinha ou se depois voltavas a elas? Por ser essa forma de te
exprimires, se depois querias voltar a esse sentimento, principalmente porque
era revoltado, ou se guardavas e hoje em dia já não queres voltar lá e não
queres voltar a sentir aquilo?
Eu não oiço mais as músicas que
fiz. As que estou agora para lançar, oiço. Oiço até porque ainda estamos em
fase de misturas e preciso de as ouvir e de opinar. Mas as coisas antigas já
não oiço, não consigo ouvir mesmo. Mas tenho que as tocar ao vivo. Há algumas
que não me dizem nada e eu até tento não as tocar, porque acho que não faz
sentido estarmos a tocar coisas que depois não transmitem nada. Mas ainda há
muitas que sim, que ainda me dizem algo. De uma maneira muito diferente do que
me diziam na altura. Tenho uma música que é a Yo-Yo que foi o primeiro single
que eu lancei do disco anterior, que era sobre a frustração de não saber estar
com alguém e saber (ou achar) que aquela pessoa era a pessoa certa, mas eu não
consigo e estou sempre naquele “vai não vai”. Hoje em dia se calhar ainda me
revejo um bocadinho nisso, mas quando toco levo a música para um lado mais
cómico e não frustrado. Há umas coisas que nos dizem sempre mais porque também
são menos de uma fase e mais de quem tu és. E essas ficam-te mais.
Tentas, portanto, que as tuas
músicas contem a tua história. Falas do teu álbum antigo como uma fase mais
revoltada, o que se pode esperar deste que vem aí?
Mais alegre, acho eu. As músicas
estão escritas de uma forma diferente, o próprio som de origem é mais relaxado,
mais chill, “a little bit more happy”. E trabalhei com o Miguel
Nicolau, produtor, e ele trouxe um bocadinho mais de leveza e upbeatness para
a cena, com a parte dos arranjos e tudo, e isso é fixe. Em termos de letra acho
que estou um bocadinho mais resolvida, sim. E, se calhar, não tão dramática.
Embora, eu seja um bocadinho dramática por natureza. É o que é. Mas mais em paz.
Nem tanto com as situações em si, mas comigo própria. Mas este EP, que são seis
músicas, é todo um conjunto. Não estou a ligar tanto às letras, embora elas
existam e sejam importantes porque estão a contar alguma coisa, mas estou a
ligar a tudo: é o bolo todo. Não estou a separar as fatias, nem os
ingredientes. E acho que o bolo todo está muito mais resolvido, muito mais
feliz.
E achas que essa mudança tem a
ver com o próprio crescimento em si ou passaste por algum processo que te
ajudou a chegar a essa maturidade?
Os dois. Acho que é inevitável
que tu cresças enquanto pessoa. E teres 23 anos ou teres 25, por pequena que
seja a diferença, é diferente. Os processos que tens na tua vida são
diferentes. Sair de casa, começar a ser independente, tudo isso me trouxe
preocupações e alegrias. E isso molda-te enquanto pessoa, enquanto storyteller.
Mas também houve situações específicas. Eu tive alguns confrontos com pessoas.
Apercebi que era muito dependente de outras pessoas para fazer algo. E tive uma
rutura de ligações profissionais que resultou em eu forçar-me a ser um
bocadinho mais autodidata até em termos de produção e a tentar perceber melhor
o que eu queria fazer musicalmente. Porque eu estava numa fase de “o que é que
eu estou a fazer?”, parecia que estava a seguir uma lista de regras e não tinha
arranjado a minha identidade. E não estou a dizer que esteja agora definida e
fechada e sem espaço para crescer, mas está a aproximar-se mais daquilo que eu quero
ser quando for grande (risos).
Como começou o teu percurso na
música?
Eu comecei na música muito cedo.
Andei num coro com as minhas irmãs. Depois tive aulas de piano, não sei nada de
piano. Tive aulas de guitarra aos 12 e depois comecei a ter aulas de canto,
assim esporadicamente. Nunca levei demasiado a sério. Até porque eu achava que
como não tinha uma voz muita aguda que não sabia cantar. Uma estupidez! Foi
desconstruindo (risos). Quando tinha 12/13 anos escrevia umas músicas a brincar
com a minha irmã Margarida que é com quem formei a minha banda. Aos 15 anos
escrevi a minha primeira música, com o meu namorado na altura (risos) que se
chama Mom e foi super divertido. Fiquei muito entusiasmada. Na altura, gravei
aquilo e fiz uma parte onde gravei três harmonias e pensei “ok, já sei como a Feist
faz”. Eu adorava, e adoro a Feist. E foi a partir daí. Sempre gostei de música,
sempre cantei, sempre fiz covers de músicas cha la la. E depois chegou
uma altura em que a Margarida começou a insistir um bocadinho mais para nós
trabalharmos juntas e para começarmos a compor e formamos Golden Slumbers. E
correu bem. As pessoas gostavam de duas irmãs a fazer harmonias, era bonito.
Então ficou. E depois aos 23, há dois anos, comecei com Monday.
Quanto tempo durou a tua banda
com a tua irmã?
Ainda dura. Estamos em pausa para
escrever o disco, que vamos lançar daqui a um ano.
Qual a tua memória mais antiga
onde a música está presente?
Nós íamos cantar ao Natal dos
Hospitais, com o Coro de Santo Amaro. E eu lembro-me, não da cantoria em si,
mas da minha mãe me dar sempre Kinder’s nos intervalos (risos). Nós nunca
comíamos Kinder, a minha mãe nunca comprava, mas sempre que tínhamos essas
atuações, ela metia ali dois Kinder’s para cada uma.
Tens o apoio da tua família?
Sim! Há pessoas que levam mais a
sério, outras menos. A minha mãe é pintora, portanto ela também sabe os struggles
de ser criativa ou artista. Percebe os desafios e a instabilidade que existem
em qualquer percurso criativo, tanto em termos de criação, como
financeiramente. Ela apoia-me, mas, como com tudo, preocupa-se. Cheguei a uma
fase da minha vida em que estou financeiramente confortável, mas é uma carreira
que demora imenso tempo a ser viável. Apesar de tudo, as coisas correm-me bem,
mas é normal que para os meus pais haja aquela preocupação de isto não ser
consistente, não ser algo seguro. Tem meses fixes, outros nem tanto. Em parte,
é também por isso que estou aqui a estudar, para ter sempre um plano B. E para
usar sempre em meu favor, na música. Mas sim, eles apoiam-me.
Ao início dizias que achavas
que não cantavas muito bem porque não tens uma voz muito aguda. Houve muitos
momentos em que duvidaste da tua voz?
A primeira vez que eu me apercebi
que podia cantar da maneira como podia foi a ouvir Laura Marling, uma artista
folk contemporânea. O que eu comecei por ouvir dela era num registo super
grave, quase spoken words e foi muito estranho porque me apercebi de que
não tenho de estar a gritar ou ter um registo mais agudo para as coisas soarem
bem. Também foi quando descobri que havia todo um mundo de folk contemporâneo
com o qual me relacionei muito. Acho que foi nessa altura, nos meus 15/16 anos
que ganhei mais confiança e que percebi que não tinha de soar exatamente igual
a todas as pessoas que eu conheço. E acho que isso até é fixe. Hoje em dia,
gosto muito mais de ouvir mulheres com um registo mais grave do que vozes muito
agudas. Tenho uma empatia especial por vozes mais out of the box. A Dua
Lipa, por exemplo, não tem uma voz super aguda e eu acho bué piada à voz dela.
Hoje em dia já não duvidas
tanto da tua voz?
Não, não, não. Eu gosto muito de
me ouvir a cantar (risos). Eu sou muito nervosa. Hoje em dia, não tanto. Mas
quando eu comecei, eu tinha muita dificuldade em pegar na guitarra e fazer os
acordes sem me falhar a mão, mas cantar nunca foi um problema para mim nesse
aspeto. Eu até confio em mim a cantar. Até é quase o meu encosto. Se estou
nervosa, começo a cantar e penso “ok, se isto está a sair bem, vai sair bem o
resto também”. Não é suposto ser arrogante (risos). Cada pessoa gosta das vozes
que gosta, não é por aí. Mas eu gosto da minha voz. É uma coisa boa de se poder
dizer!
Quais os teus objetivos para o
futuro? Gostarias de fazer música só em Portugal ou fazer música no
estrangeiro?
Gostava de ir para fora, claro.
Acho que há um mercado enorme por explorar que cá nunca vou conseguir. Há
oportunidades diferentes. O facto de eu fazer música em inglês às vezes é um
bocadinho uma barreira cá. Até passo em bastantes rádios cá, mas é coisas mais
como a Vodafone, Antena 3, Radares, etc. que são mais para música alternativa,
independente ou indie. As rádios maiores estão mais sujeitas à língua
portuguesa quando estas são de autores portugueses. Eu sei que isso é uma
barreira, mas eu não sei escrever em português. A forma como escrevo em inglês
é minha, se escrevesse em português ainda não era meu, estaria a adaptar-me àquilo
que eu ouço escrito em português e não ia arranjar uma linguagem que fosse
minha. Para estar a fazer coisas que não me soam bem: não, obrigada.
Se fores para fora, irás
confrontar-te com a fama. É uma coisa que te assusta e que gostavas de
contornar ou achas que enquanto cantora terás de aprender a lidar com isso?
Fama? Acho que isso não vai
existir (risos). Eu acho que há milhões de projetos, e alguns deles
bem-sucedidos, que nunca chegam a esse tipo de fama. Chegam a um ponto de se
autossustentar e um extra, é isso que eu quero. Eu não quero ser a Ariana
Grande, até porque nem sequer tenho nada para dar como ela tem. São muitas
vezes produtos montados desde muito cedo, pensados com uma equipa gigante. Eu
não tenho isso e acho que não vai acontecer. Nem acho que em termos de
personalidade ou da minha música, isso faça algum tipo de sentido. Eu quero ser
cem por cento autossustentável. Eu gostava, claro, de ir tocar a salas grandes
e bonitas. É esse o sonho. E, se calhar, é para isso que eu trabalho inconscientemente,
mas, para já o objetivo é ser cem por cento autossustentável, depois, logo se
vê.
Lançaste o “Little Fish” no
dia 11. Qual é a história dessa música?
Eu tinha um peixe, o Osvaldo. Ele
morreu passadas três semanas. Eu tinha ido a uma festa qualquer, cheguei a casa
por volta da meia noite e vi o peixinho morto e isso abalou-me completamente.
Fiquei mesmo triste no momento. Eu não sou pessoa de chorar, mas comecei a
chorar. Depois comecei a perceber porque é que tinha tido tanto impacto em mim;
pelo facto de eu ter uma necessidade gigante de controlar tudo e de ter
controlo na minha vida e em tudo o que acontece. Ali, senti-me completamente defectless.
Tinha um animal de estimação, que era minha responsabilidade, e ele morreu. Isto
soa super dramático (risos). E fiquei triste. Não consigo cuidar de nada, nem
das minhas coisas; não tenho controlo em nada (risos). A vida é incontrolável.
Depois comecei a escrever uma música sobre isso, mas de um ponto de vista mais
leve e menos zangado, menos dramático. Mas a mensagem é um pouco a de que a
corrente vai e eu também tenho de ir. Eu não controlo nada, mas não posso só
bater o pé e pronto. Tenho claro de assumir responsabilidade por aquilo que eu
sou e por aquilo que faço, mas aceitar que a vida é, de uma forma muito básica
e foleira, uma corrente. Nós estamos aqui só a nadar.
(capa do single cedida pela própria) |
Falávamos há pouco que este
álbum não tem muito que ver com o anterior. A versatilidade do mundo da música
é algo que te entusiasma sobre o meio?
Claro, claro! Acho que uma das coisas
mais cruciais para mim, especialmente com Monday, foi sentir que eu não estou
só sujeita a fazer algo que encaixe neste estilo de música. Nem falo de letras
porque isso vem de mim e, por isso, é sempre um pouco da minha biografia ou de
algo que aconteceu, tem sempre algo meu. Mas em termos de estilos, sim. Ter
essa liberdade de poder fazer o que eu quiser, é a melhor coisa do mundo! E
entre aquilo que eu tenho com o meu disco One e aquilo que eu vou fazer agora
para este EP são sonoridades completamente diferentes. Embora, no final do dia,
sou eu e isso confere-lhes uma linha de continuidade.
Além disso, o que mais te liga
à música?
Há uma necessidade intrínseca em
mim de fazer música. Não planeio propriamente fazer isto ou aquilo, compor neste
dia ou naquele; é mesmo uma extensão de mim própria. Não digo que o faça quando
me apetece porque temos de ser um pouco mais metódicos e disciplinados do que
fazer quando vier a inspiração. Mas faço isto porque estou ligada à música,
quer seja de uma maneira mais profissional ou menos profissional. Gosto mesmo
de escrever, de tocar, de estar irritada e saber que posso escrever o que estou
a sentir num papel e ficar ali. Até que isso deixe de acontecer, vou sempre
gostar de fazer música. Se calhar, um dia vou acordar e já não me diz nada e
vou insistir e passam-se 5 anos e continuo-me a aborrecer e aí logo se vê.
Tens alguma referência na
música?
Tenho várias. Mas acho que se
tornam bastante obsoletas por que dependem muito de fase para fase. Para esta
nova etapa andei a ouvir muito mais R&B, muito mais miúdas a cantar; e isto
foi totalmente involuntário, não foi uma discriminação de género. Dei por mim a
ouvir 90% de mulheres a cantar. Comecei a ouvi muito Alice Phoebe Lou, Joy
Crookes ou Sigrid. Se calhar não têm muito a ver com o que estou a fazer, mas
tem a ver com o feeling da música; há músicas que te deixam mais feliz e só pensas
“quão fixe deve ser tocar isto ao vivo”. E se calhar é mais isto que eu procuro
quando estou a fazer pesquisa propriamente dita.
Não ouves muito as músicas que
passam nas grandes rádios porque não te identificas, por não ser isso que
queres fazer, ou não gostas tanto?
Depende. Eu sou mega fã da Ariana
Grande. E ela é híper comercial. É tudo pensado, são dez songwriters
para escrever uma música, é totalmente o oposto do meu processo. Mas admiro muito
e gosto muito. No final do dia, a música tem de me dizer alguma coisa. Não
importa se é mais comercial ou menos comercial. Por acaso quando vou procurar,
sou um bocadinho mais tendenciosa e sim, vou procurar coisas mais
independentes, mais alternativas porque não me revejo totalmente na fórmula de
músicas comerciais. Mas não tenho nada contra, até gosto muito; não de tudo,
evidente, mas há várias coisas que gosto.
A tua preferência musical
faz-te ter algum festival de eleição?
Sim. Gosto muito do Vodafone
Paredes de Coura, voltei a ir este ano. Gosto muito do Bons Sons, um festival
em Tomar, Cem Soldos. Já lá toquei, tanto com Golden Slumbers como com Monday. Porque
é um festival pequenino, super independente, só com bandas portuguesas. Algumas
são mais conhecidas, outras menos. Mas há um grande sentido comunitário que é
muito bonito e importante de se valorizar. E ergue a música portuguesa, não são
só nomes estrangeiros. Eu gostava muito do NOS Alive, hoje em dia já não gosto
de me sentir uma sardinha em lata. Gosto do Super Bock Super Rock, agora que
voltou ao Meco ainda gosto mais. Acho que um festival ganha muito pela
envolvência. E do Nos Primavera Sound, também gosto muito.
Portugal é rico em festivais. É
fácil fazer música em Portugal?
Fazer é, teres dinheiro com isso é
que não. Fazer música qualquer pessoa pode, desde que tenhas vontade e
iniciativa e a faças. Que isso seja sustentável, depende. Eu acho que se
começares logo com uma abordagem de “vou fazer isto para vender” e venderes
para outras pessoas cantarem, se calhar até funciona. Mas acho que é difícil de
qualquer forma porque não tens um caminho delineado. Nada é estável, nem uma
linha reta. Às vezes sobes e depois desces três vezes mais do que subiste. Mas
eu acho que em Portugal, as coisas estão melhores. Pelo menos eu sinto isso.
Acho que há mais valorização de música portuguesa, feita em Portugal. Há mais
oportunidades, há mais rádios a apostar em música independente. É difícil na
mesma. Mas é difícil em qualquer lado. Em Portugal, o mercado é mais pequeno,
por isso talvez seja mais difícil. Mas, por outro lado, quando estabilizas,
também consegues.
És fã de música portuguesa?
Sim, sim. Há bastantes coisas que
gosto. Oiço muito Ornatos Violeta, gosto muito de Samuel Úria, nós até já
colaboramos com ele. Bruno Pernadas, gosto muito. Luís Severo, Capitão Fausto.
Hoje em dia há umas quantas bandas que eu acho que são muito boas. E acho que
há cada vez mais bandas a começar. A minha irmã Margarida também tem a banda
dela que se chama Vaarwell de que também gosto muito.
Achas que há mais pessoas a
meter a tua música na caixinha do gosto ou do não gosto?
Acho que na do gosto. Não é uma
música muito difícil de se ouvir. Não digo que todos os que dizem que gostam
oiçam muitas vezes ou sintam borboletas no estômago. Vou dizer no gosto, espero
não estar errada (risos). E espero que daqui para a frente seja ainda mais no
gosto e não no não gosto.
Quantos concertos já deste?
Com Monday, entre 30 a 40 no
espaço de 2 anos. Isto incluindo coisas pequenas e mal pagas, ou não pagas.
Costumam ficar para falar
contigo no final dos concertos?
É normal virem falar comigo. Até
porque eu muitas vezes digo que tenho discos à venda. Fotografias, geralmente é
com os putos. Os pais foram ver e eles gostaram e vão tirar uma fotografia. É
sempre giro.
Alguma vez já foste
reconhecida na rua?
Já aconteceu, em duas ocasiões,
eu estar com a minha irmã Margarida e chegarem perto dela e dizerem “Ah, tu és
das Golden Slumbers” e a fazerem conversa. E eu, ao lado, e eles sem se
aperceberem que eu fazia parte também (risos). Isto é um sinal qualquer de que
a minha cara passa ao lado. Portanto, não. Ou então ninguém veio falar comigo.
Tens mais cuidado agora com o
que partilhas nas redes sociais?
Não tinha cuidado nenhum antes,
publicava tudo. Mas um amigo meu, que me está a ajudar nesta fase, a tirar
fotografias e a planear um bocadinho a comunicação; esteve comigo a trabalhar
nisso apagamos cerca de 300 posts que eu tinha (risos). Acho que temos
de limar um pouquinho a imagem e tenho de ter algum cuidado; não pôr
fotografias das minhas irmãs, por exemplo. Porque depois parece uma coisa
demasiado casual, que pode funcionar para certas pessoas, mas eu também não
quero dar isso. Quero manter uma imagem mais profissional, não quero ser só a
amiga que está a tocar, quero que me levem a sério. Não quero deixar de ser eu,
porque isso também é uma seca, mas ter algum cuidado com aquilo que eu publico.
Mas mais do que em redes sociais, tenho muito mais feedback nos
concertos ao vivo. Há mais pessoas a falar comigo, a dizer-me que gostaram
mesmo e que estão interessadas no que se está a passar. Portanto, tocar mais é
a melhor forma de chegar a mais pessoas.
O que mais gostas na música
são os concertos?
Sim, hoje em dia gosto mais de
concertos. Não é só. Adoro tudo o resto. Adoro estar a gravar, adoro compor, a
trabalhar na parte da produção. São tudo etapas muito diferentes, mas são todas
muito especiais e todas importantes. Depois de teres o teu filhote cá fora, é
bom mostrá-lo ao mundo e sentires as reações das pessoas.
Qual foi o concerto mais
marcante?
O primeiro de todos, em 2017, foi
no Teatro do Bairro. Ainda não tínhamos lançado nada, era tudo mega fresco.
Acabadinho de estar feito. Esse concerto foi super especial, super divertido
porque era a primeira vez que estava a tocar. E acho que quando é a primeira vez,
tu lembras-te sempre. Há ali todo um rush of emotions e tem um lugar
especial na tua memória. Uma vez também toquei numa tascazinha, num festival
itinerante que havia no Barreiro. Toquei meia hora, depois passava para outra
pessoa. Mas as pessoas estavam a um metro de mim e estava tudo em silêncio e
com os olhos em mim, o que é um bocadinho intimidante, mas sentes ali uma special
connetion.
Onde sonhas atuar?
Em Portugal, no Coliseu de
Lisboa. Com uma banda gigante, e várias vozes. Esse é o sonho. É uma sala super
bonita. Além disso, dizeres que vais tocar ao Coliseu em nome próprio tem algum
poder. Até podiam estar só vinte pessoas. Claro que ia ficar um bocadinho
triste, mas um programador pensar “ela vale a pena” e levar-me ao Coliseu… eu
acho que quando vais para um Coliseu é porque, à partida, tens um nome
justificável.
Vais a muitos espetáculos de
música?
Sim. No verão é mais a festivais.
Tenho tentado fazer esse exercício de tentar meter dinheiro de parte e ir a
concertos. Às vezes vou ver concertos e fico muito desapontada. Mas mesmo esses
de que não gosto são super educativos para coisas que eu não quero fazer.
Quando são concertos bons, não estou a desmaterializar a situação, fico só a
aproveitar.
Como te imaginas daqui a 5
anos?
Com 30 (risos). No meu mundo
ideal, com um palacete em Sintra e com 4 cães (risos). No mundo real, não sei.
A fazer música, a tocar muito mais, com mais discos, pelo menos mais dois. E
idealmente com mais abertura para fora, já ter dado uns passos fora de
Portugal.
E se a música não der certo?
Vai dar. Tem de dar! Se não der
mesmo, vou para comunicação de qualquer coisa. Mas vai dar. Nem que seja a
escrever jingles para a marca x e y. Tenho de estar dentro da música e
continuar a escrever. Porque eu vou sempre escrever, quer me dê dinheiro ou
não, é quem eu sou.
Sentes-te realizada?
Sim, muito! A sério. Mesmo que
seja uma mulher de 30 anos pobre, serei feliz.
E és feliz?
Sim, claro.
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