(des)Conforto


Pensamos em conforto e inevitavelmente é a imagem da nossa cama que nos preenche logo o pensamento, certo? Quem fala em cama, fala em sofá, aquele tapete fofo em que nos sentamos a ler o nosso livro preferido ou aquele pufe que o nosso gato sempre ocupa por nós. Quem fala em conforto pensa no seu lar, na comidinha quente feita pela mãe ou num almoço em família ao domingo. Pensa-se em conversas animadas, piadas privadas; pensa-se em família e em amigos! O conforto de uma vida monótona, de não enfrentar grandes desafios porque "estou bem assim, obrigada". 

- Vamos mudar-nos! 
- Como assim "mudar"?
- Vamos para a cidade!
- Como assim "para a cidade"?
- Não é óbvio?! Precisamos de sair daqui! e vamos juntas.
- Juntas? Só vocês as duas?
- Sim. E acho que estamos prontas para sobreviver. 
E de facto estavamos, estavamos prontas para sobreviver. Fizemos comer, quando era preciso fazer; limpamos tudo aquilo que era preciso limpar; demos o ombro quando a outra precisava de chorar; ouvimos as mesmas músicas; passamos toda a energia que conseguimos e, felizmente, na nossa casa, respira-se felicidade! Mas não esperavamos que fosse tão difícil assim ...
Na realidade, não é fácil abandonar o conforto. Aquele conforto de ter a família em casa quando chegamos à noite, de acompanhar de perto o dia a dia daqueles mais nos acompanharam desde sempre. Não é fácil um dia dizer "Vou confortar-me sozinha".
Mas às vezes é necessário. É necessário sair da nossa zona de conforto física e psicológica. É preciso dizer adeus a tudo o que conhecemos se isso implica a nossa felicidade.

- Olá. O meu nome é Maria e este é o meu primeiro ano aqui. 
- Porque vieste?
- Não era feliz. 
Muitas vezes, aos que nos ouvem, este não é motivo suficiente para se abandonar tudo aquilo que algum dia se conheceu. Mas foi o que eu fiz. Abandonei o único quarto onde dormira, abandonei as ruas que conhecia "de trás para a frente", a única escola que alguma vez tinha frequentado e as únicas pessoas que alguma vez vira. Estava fechada num círculo a que chamam vila, mas tive de sair; simplesmente para ser feliz. Abandonei tudo aquilo que era o meu conforto desde que nascera.

- Olá. O meu nome é Maria e este é o meu primeiro ano aqui. 
- Porque vieste?
- Não era feliz. 
A conversa repete-se. Uma e outra vez. E mais uma. 
Até que um dia alguém consegue ouvir toda a história e diz apenas «Corajosa». E é verdade. É preciso, acima de tudo, coragem. É preciso querer algo mais do que conforto. Porque é bom estarmos deitados na cama, tapados com o nosso edredão e rodeados dos nossos peluches preferidos, no entanto, não é na cama que lutamos pelos nossos sonhos. 
Por isso, à próxima pessoa que me perguntar, direi apenas:
- Olá. Sou a Maria e é o meu primeiro ano aqui, a lutar pelos meus sonhos.

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