O Natal

Li. Li devagar. Cada palavra lentamente. Li em voz alta. Cheguei ao fim, ao último ponto final e esperei que houvesse mais. Mas não havia.
Então retomei. Li tudo de novo. Esperei que no fundo aquele texto não dissesse o que eu acabara de ler ... mas dizia. 
Então fiquei sentada na cama. Olhava a janela por onde entrava um pequeno feixe de luz do fim do dia e com lágrimas nos olhos pensava: "Como pode alguém não gostar do Natal?".

O Natal ...
Aquela época do ano em que recebemos os telefonemas dos familiares mais distantes, em que todas as tias querem dar dois dedos de conversa pelo telefone. A correria de arranjar presentes para todos e sobremesas novas para a consoada. 
A minha avó está na cozinha, atarefada com o bacalhau e o peru simultaneamente. O meu pai aquece a casa. Acende-se a lareira de manhã na maior sala - naquela que se abre só para o Natal. Eu ponho a mesa. A loiça mais bonita, os copos iguais, os guardanapos vermelhos e as toalhas com azevinho. 
O dia passa num instante e quando chega a noite estamos todos cansados. Jantamos em família. O pai conta histórias e toda a gente ri. Eu e a minha irmã contamos os segundos até à meia-noite enquanto a avó diz "Abram os presentes já!". A minha mãe vai à cozinha buscar o bacalhau e depois o peru e depois a sobremesa. Desce a escada, sobe a escada, desce a escada, volta a subir ... 
Jantar terminado! 
Enquanto se conversa à mesa, eu e a minha irmã vamos ver os desenhos animados na televisão. Comemos mais doces e mais e mais ... 
Até que ... chega a meia-noite! 
Juntamo-nos todos bem perto da árvore de Natal e a minha mãe começa a distribuir os presentes. 
- Este é para o pai, aquele para o avô. Não é para esse avô, é para o outro! 
Há sempre uns presentes pequenos em caixas enormes, ou umas caixas repletas de pistas que nos obrigam a correr pela casa toda. Há embrulhos com livros que já lemos ou CD que já ouvimos. 
Há uma câmara de filmar sempre apontada para todos de forma eternizar estes presentes mais cómicos e estes momentos em família. 
No final, fico triste quando acaba. Fico triste quando os meus avós saem e dizem "Resto de Feliz Natal! Até amanhã!". Fico triste porque quero mais. Não, não são mais presentes ... quero mais gargalhadas, quero seguir pistas pela casa novamente, quero ouvir de novo as histórias que o meu pai conta todos os anos, quero mais horas de Natal. 

Acordamos, é dia 25! Arrumamos o que foi deixado da noite anterior e preparamos o almoço de Natal. Geralmente volta a comer-se bacalhau ou peru, mas não faz mal.
-O tio chegou!
E como é bom ver o tio ... O almoço é divertido, toda a gente ri muito! Conversamos sobre a escola e as notas. Contamos novidades. E dizemos "Até à próxima" sem saber muito bem quando será.

E passou ... acabou! Foi tão rápido! E só volta no próximo ano. 
Mas ainda assim, eu gosto do Natal. De toda a agitação, da família toda junta ... 

Ahh, então é isso. Acho que já entendi. 
Não gostas do Natal porque não tens nada do que eu tenho, não é? 
Já não tens a tua avó na cozinha, o avô a rir-se das prendas que recebeu, as tuas tias a telefonar. Já não há sobremesas novas nem tens a quem comprar presentes. 

Já percebi porque não gostas do Natal. Quem me dera não ter percebido ...


You May Also Like

0 comentários